Isaque Criscuolo
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@isaque.criscuolo
Web e app design

O que é o metaverso e como será a internet do futuro?

  • por Isaque Criscuolo @isaque.criscuolo

Do mundo real aos desafios do mundo virtual, descubra tudo sobre o metaverso e como o conceito pode mudar a internet

No episódio San Junipero, da terceira temporada de Black Mirror, nos deparamos com um futuro em que as mentes de pessoas que morreram são adicionadas a um mundo virtual para que vivam pela eternidade como versões jovens de si mesmas.

No filme Ready Player One, dirigido por Steven Spielberg em 2018 e baseado no livro de mesmo nome, escrito por Ernest Cline em 2011, um mundo virtual chamado OASIS é utilizado como fuga de um futuro distópico horrendo.

Nos exemplos acima citados, criados pela ficção científica, nos deparamos com as possibilidades da realidade virtual, de universos habitáveis além do mundo físico. São arquétipos amplamente conhecidos por milhões de pessoas de todo o mundo do que chamamos de metaverso.

Será o metaverso a nova versão da internet? Ilustração por Maja Dabek
Será o metaverso a nova versão da internet? Ilustração por Maja Dabek

Recentemente, você pode estar ouvindo falar mais no assunto, depois que no evento Facebook Connect 2021, realizado no dia 28 de outubro, Mark Zuckerberg oficializou a mudança de nome de seu conglomerado de empresas e indicou a futura aposta do gigante tecnológico.

Com o nome Meta, inicia-se uma nova fase na multinacional americana, que manterá sua família de aplicativos - incluindo o Facebook -, mas com foco em um novo ramo de negócio que desenvolverá plataformas de realidade virtual.

Zuckerberg acredita que o metaverso é a nova versão da internet, uma plataforma que usaremos cada vez mais para simular presença, para nos reunirmos com pessoas e vivermos experiências. No entanto, o conceito de metaverso vai muito além do que uma empresa, ou um grupo delas, pode criar para gerar negócios. É, inclusive, um conceito que existe há muito tempo.

Afinal, o que é o metaverso?

Antes de tudo: o metaverso não é uma novidade e muito menos uma criação do Facebook. O conceito surgiu no livro de ficção científica Snow Crash, do escritor Neal Stephenson, em 1992. Na história, o metaverso é um mundo virtual em 3D povoado por avatares de pessoas como nós, interagindo com diversos tipos de experiências. É daqui a origem do termo e de suas principais ideias.

Neste mesmo contexto, há 18 anos surgia o Second Life, um espaço virtual criado pelo estúdio americano Linden Lab para ser como uma segunda vida, um espaço para novas experiências. Marcas chegaram a investir em lojas virtuais dentro deste novo mundo mas, apesar da vasta cobertura mediática e do buzz inicial, o Second Life não se tornou mainstream - embora ainda exista, limitado a um nicho, com uma comunidade pequena -, o que mostra como nem sempre as primeiras ideias de uma plataforma funcionam a 100% na prática.

O 'Second Life' surgiu como um espaço virtual para novas experiências. Foto: Linden Lab
O 'Second Life' surgiu como um espaço virtual para novas experiências. Foto: Linden Lab

Na visão do investidor Matthew Ball, especialista no assunto e autor do Metaverse Primer, um hub com explicações dos principais conceitos e desdobramentos do metaverso, esta é a melhor definição:

“O metaverso é uma rede permanente de mundos em 3D renderizados em tempo real e simulações que suportam a continuidade de identidade, objetos, história, pagamentos e direitos, que podem ser experimentados de forma sincronizada por um número efetivamente ilimitado de usuários, cada um com um senso de presença individual.”

Resumindo, um conjunto de espaços nos quais podemos vivenciar experiências virtuais. Ou, nas palavras da pesquisadora Janet Murray ao site Institute of Network Cultures, "uma reunião mágica de Zoom com toda a versão lúdica de Animal Crossing”.

Mundo real vs. mundo virtual

Mas, será que, finalmente, o mundo real está preparado para abraçar em definitivo o mundo virtual proposto pelo metaverso? Será que o poder e o dinheiro do Facebook - agora Meta - são os ingredientes que faltavam na receita que tem vindo a ser trabalhada nos últimos 20 anos pelo Linden Lab e por muitas outras companhias de videogames, como a Epic Games, criadora de Fortnite?

As respostas a estas e outras questões relacionadas com o metaverso podem ainda não ser totalmente claras e até agora as promessas de um futuro virtual realista e ao alcance de todos têm consistentemente falhado, não terminando de convencer o consumidor comum.

No entanto, no período pós-pandemia e, principalmente, com as mudanças aceleradas no âmbito do trabalho, que a maioria de nós experimentou no último ano e meio, algo novo parece estar acontecendo.

No filme 'Ready Player One', baseado no livro de Ernest Cline, existe um mundo virtual chamado OASIS. Foto: Warner Bros
No filme 'Ready Player One', baseado no livro de Ernest Cline, existe um mundo virtual chamado OASIS. Foto: Warner Bros

Isso mesmo podemos constatar em um relatório de 2020 da consultora PwC, que prevê que em 2030 quase 23.5 milhões de empregos usarão Realidade Virtual e Realidade Aumentada para tarefas como formação, reuniões e serviços de atenção ao cliente.

Em um artigo sobre Macrotendências de Entretenimento e Mídia até 2025, publicado em Setembro de 2021 no site brasileiro da mesma consultora, o consultor Ricardo Queiroz explica que, no que respeita à Realidade Virtual, "apesar da expansão de 31,7% em um ano no qual muitas pessoas ficaram trancadas em casa com pouca coisa para fazer, o mercado não conseguiu atingir todo o seu potencial em 2020. Mais lenta do que se esperava, a adoção da VR pelos consumidores fez crescer o foco na categoria empresarial e no potencial da VR para aplicações comerciais".

E o especialista conclui: "Os games continuarão a ser o conteúdo principal em VR durante o período da nossa previsão, mas os vídeos em VR geraram US$ 615 milhões em receitas no ano passado e vão alcançar US$ 1,4 bilhão em 2025".

"Isso é muito Black Mirror!"

Para Ana Raquel Hernandes, Head do Yahoo Creative Studio, o estúdio de produção de branded content e experiências imersivas do Yahoo no Brasil, "as definições do que é metaverso ainda estão sendo construidas".

"Partindo da premissa mais recorrente de que o metaverso é a convergência dos mundos real e virtual de forma persistente e compartilhada entre todos, quase como uma internet em 3D, todas as áreas criativas que hoje já compõem o ambiente digital tendem a se beneficiar: de programação a modelagem 3D para tecnologias de realidade estendida como AR e VR,l design, experiência do usuário (UX), direção de arte, audiovisual, redação e storytelling, gamificação. E novas disciplinas, que nem imaginamos, vão surgir", diz a especialista em entrevista à Domestika.

No episódio 'San Junipero', de 'Black Mirror, as mentes de pessoas que morreram são adicionadas a um mundo virtual
No episódio 'San Junipero', de 'Black Mirror, as mentes de pessoas que morreram são adicionadas a um mundo virtual

Na opinião do jornalista e especialista em marketing, Gustavo Miller (@gumiller), que na Domestika ministra o curso Content marketing: do planejamento à execução, o que vivenciamos durante a pandemia através do distanciamento social acelerou comportamentos que antes ficariam no âmbito do "Isso é muito Black Mirror!": "Se antes algumas mudanças pareciam futuristas demais, distantes, hoje estamos vivenciando-as diariamente".

"A pandemia mudou a maneira como interagimos com o mundo digital e o mundo real, no sentido de que ficamos bastante em casa e passamos a questionar o quão produtivas ou interessantes são as experiências reais. Recentemente fui a um evento presencial e enfrentei diversos problemas como filas, custos altos de deslocamento e alimentação que poderiam ser resolvidos com uma experiência híbrida em que eu poderia consumir o mesmo conteúdo de forma digital, em casa, sem todo esse stress", considera Gustavo em conversa com a Domestika.

É pensando neste tipo de situação que a nova empresa de Mark Zuckerberg está testando espaços para reuniões virtuais, mediadas por avatares. Um recurso que também vem sendo testado pela Microsoft em sua plataforma Teams, ou pela Gather, muito popular nos Estados Unidos da América. De acordo com essa visão, poderemos experienciar novas formas de interação em situações consideradas chatas ou maçantes.

Espaços para reuniões virtuais estão já a ser testado com o projeto Horizon Workrooms, da Meta. Foto: Meta/Facebook
Espaços para reuniões virtuais estão já a ser testado com o projeto Horizon Workrooms, da Meta. Foto: Meta/Facebook

Mais imersão significa também criar plataformas que não estejam isoladas dentro de ecossistemas de grandes corporações. É preciso pensar em como estas novas experiências poderão ser abertas e mais democráticas. "O metaverso é mais uma oportunidade que as corporações têm de conexão e entendimento do comportamento do consumidor, por exemplo.

Uma grande empresa pode ser provedora de logística e estrutura para uma outra marca que exista apenas no metaverso; oferecendo serviços por assinatura, por exemplo. Produtos podem (e já estão) ser testados nesses ambientes virtuais, para avaliar a receptividade do público e, eventualmente, desenvolvê-los no mundo real e vice-versa", salienta Ana Raquel.

Viveremos no metaverso?

Se levarmos em consideração as possibilidades do metaverso e os avanços tecnológicos contemporâneos, é de se pensar que um dia esta nova versão da internet possa substituir tudo o que conhecemos como mundo virtual, certo? Errado.

Para o cineasta e especialista em Realidade Virtual, Ricardo Laganaro, não viveremos aquela realidade vista no filme Ready Player One. "Temos que pensar que o metaverso é um encontro entre mundo físico e digital. Isso já está acontecendo há muito tempo, desde quando começamos a utilizar celulares. Vivemos no mundo real, físico, com muitas interações digitais e estamos pensando em formas cada vez mais integradas para vivenciar o mundo físico, não o contrário", diz Laganaro à Domestika.

Tecnologias como Realidade Virtual e Aumentada estão avançando e são cada vez mais acessíveis
Tecnologias como Realidade Virtual e Aumentada estão avançando e são cada vez mais acessíveis

Para Laganaro, embora tecnologias como Realidade Virtual e Aumentada estejam avançando e tornando-se mais acessíveis, com versões de óculos menores e mais eficientes, não deixaremos de vivenciar o mundo físico. Afinal, ainda precisamos comer e dormir, por exemplo.

"É como quando a internet surgiu e falávamos que iríamos para o ciberespaço, mas hoje nem percebemos que estamos conectados. O que vai acontecer é uma melhoria nas experiências de presença e conexão", prevê o cineasta.

Oportunidades profissionais

Para criar estas experiências, áreas como design, programação, ilustração, sound design e animação receberão uma demanda extra.

Questionada pela Domestika sobre quem serão os profissionais chamados a construir o futuro do metaverso, a pesquisadora consultora e professora nas áreas de mídias sociais, Carolina Terra, alerta: "Este não vai ser um ambiente inclusivo. Vai se restringir a quem tem habilidades para desenvolvimento, afinal não estamos falando de experiências simples. São experiência sofisticadas que precisarão de profissionais de design e tecnologia, no momento em escassez no mercado".

"O lado bom é que veremos muitos cursos surgindo para desenvolver novos profissionais. Mas, ainda vai levar bastante tempo para se tornar algo massivo", diz Carolina.

Especialistas em desenvolvimento serão os mais procurados para construir as experiências sofisticadas do metaverso
Especialistas em desenvolvimento serão os mais procurados para construir as experiências sofisticadas do metaverso

Possibilidades do metaverso no presente e no futuro

Quando falamos das possibilidades do metaverso no presente, algumas coisas já estão delineadas como uma nova maneira de interagir com amigos e familiares em chamadas ou reuniões de trabalho. Eventos presenciais também podem se beneficiar com experiência híbridas, assim como consultas médicas, reuniões de escola, venda e customização de roupas e até mesmo shows de artistas e instalações de arte.

Fornite, jogo online com uma base gigantesca de usuários, vem experimentando com show virtuais de artistas como Travis Scott e Ariana Grande. Além da experiência musical, os jogadores podem comprar as roupas, ou skins, de seus ídolos e jogar de forma personalizada.

A artista Zara Larsson recentemente utilizou a plataforma Roblox, dedicada a games, para vender itens personalizados como mochilas, óculos de sol e chapéus para avatares, faturando mais de um milhão de libras.

Evento de 'Fortnite' com shows de Ariana Grande
Evento de 'Fortnite' com shows de Ariana Grande

"Quando consideramos o futuro, o avanço de tecnologias como o 5G vai possibilitar produções de maior qualidade gráfica, mais rápidas e possivelmente mais acessíveis. O uso de inteligência artificial e dados nos projetos vai se juntar a criatividade para permitir coisas como criativo dinâmico em realidade aumentada e mídia programática em games, além de mais experiências híbridas em ativações em estádios, festivais, etc - algo que inclusive já vem acontecendo nos mercados em que a tecnologia está mais avançada", conta a Head do Yahoo Creative Studio no Brasil, Ana Raquel Hernandes.

Ética e privacidade de dados

Diante de tantas mudanças e possibilidades, surgem questões delicadas como privacidade de dados e comportamento. Como usaremos tais tecnologias? Como irão nos afetar? Para Ana Raquel, "a tendência é que se reproduzam no mundo virtual comportamentos que já existem no mundo real - para o bem e para o mal".

"Novamente, já temos uma prévia disso hoje, nas redes sociais e nos games. Provavelmente teremos de construir um código de ética comum desses ambientes e precisaremos definir como ele será aplicado e por quem - uma vez que o metaverso, na concepção mais pura, por assim dizer, não terá um dono", diz a especialista.

Poderá a privacidade de dados estar ainda mais em risco no metaverso?
Poderá a privacidade de dados estar ainda mais em risco no metaverso?

Para Carolina Terra, todos os problemas que já temos em redes sociais estarão presentes no metaverso, como predição de comportamento e privacidade zero. "Tudo o que fizermos dentro desses ambientes será facilmente rastreado e, provavelmente, os dados serão utilizados sem o nosso consentimento", considera.

Já Elizabeth Saad Corrêa, Doutora em Ciências da Comunicação pela Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo (ECA‑USP), também ouvida pela Domestika, lembra: "O usuário imerso na virtualidade tende a expor mais a barreira do privado, deixando um sistema digital entrar na sua 'casa' e coletar dados, percepções e sentimentos. Isso quase que sem limites por conta do encantamento do mergulho virtual. Com isso, a ética é quebrada. Falamos de uma ética algorítmica que funciona com regras próprias que, em geral, não são legitimadas como um consenso na sociedade".

Ricardo Laganaro, por sua vez, tem esperança que, por conta da experiência que tivemos com a internet e seus problemas, causados por falta de uma referência do que deve ser feito, o metaverso possa vivenciar uma construção mais sadia, open source e responsável.

Tendo em conta a experiência que já temos com a internet atual, poderá o metaverso ser mais responsável?
Tendo em conta a experiência que já temos com a internet atual, poderá o metaverso ser mais responsável?

No que respeita a ética e respeito pela privacidade de dados, as dúvida parecem ser, por agora, mais que as certezas. Mas, Ana Raquel Hernandes conclui: "Num metaverso ideal, eu tenho um ID único que me conecta em todos os 'espaços' deste mundo e sei que uso será feito dos meus dados. Essa parte estando clara, acredito que os consumidores não terão problema em compartilhar seus dados em troca de experiências positivas, como aliás já fazemos hoje com um e-commerce que nos atende bem ou para consumir um conteúdo que é relevante para a gente".

Ainda longe de possibilidades como as de Black Mirror ou Ready Player One, o que o futuro mais próximo parece reservar para o metaverso são discussões de como tornar as experiências destes novos universos em algo positivo e possível no mundo físico e real que conhecemos tão bem.

E você? O que acha do metaverso? Deixe suas ideias na caixa de comentários abaixo!

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