@harry_davies
Afrofuturismo: como criativos negros constroem um futuro melhor
Conheça o afrofuturismo e o que ele nos ensina sobre o poder da ficção, esperança e imaginação
Antes de se aprofundar no afrofuturismo, vale a pena pensar sobre o futurismo. Ele pode soar como um conceito artificial de ficção científica, mas esse é exatamente o ponto: toda teoria sobre o futuro precisa ser baseada na ficção, pois o futuro ainda não chegou.
Um futurista encontra significado no futuro, imaginando o que será possível quando chegarmos lá. Na literatura, esse ato é frequentemente chamado de ficção especulativa. O futurismo, no entanto, pode ser aplicado a inúmeras disciplinas, da arquitetura ao direito.
Ao utilizar o futuro como ponto de partida, futuristas podem estabelecer mundos, ideias e criações que incorporem suas crenças, levando-nos a observar o que pode ser possível e o que precisa ser feito para que isso se materialize.
Pantera Negra
Há muitos tipos de futurismos, mas o mais famoso, de longe, é o Afrofuturismo. Sua criação de maior sucesso comercial é o filme Pantera Negra, lançado em 2018 pela Marvel.
Ambientado em Wakanda, uma utopia imaginária onde a cultura negra e africana prosperam e representam o auge das conquistas humanas nas áreas de tecnologia, arte e política, o filme foi um enorme sucesso comercial.
Imaginado, escrito e realizado por criadores negros, trouxe o Afrofuturismo à consciência pública com uma estética e um enredo inspirado na cultura negra e nas tradições africanas.
Por que o Afrofuturismo é tão influente?
O destaque do Afrofuturismo pode, de certa forma, ser explicado por uma necessidade maior: as injustiças enfrentadas pelas comunidades negras ao longo da história, da escravidão à brutalidade policial, exigem a capacidade de imaginar um futuro melhor. Como afirma o afrofuturista Lonny J Avi Brooks, os negros sempre precisaram “criar novas tecnologias negras para reparar os traumas pelos quais acabaram de vivenciar e continuam experimentando”.
Embora possa parecer estranho depositar suas esperanças em uma história em quadrinhos, a ficção especulativa e a imaginação com propósito nos permitem não apenas sonhar com nossos objetivos, mas também acreditar neles e persegui-los. Como diz Angela Davis: “Para trabalhar em direção a um futuro melhor, precisamos acreditar que este futuro é possível”.
O sucesso de projetos como Pantera Negra mudou a maneira como vemos a África e sua diáspora. Imaginar um mundo onde a cultura negra pôde florescer desperta nosso olhar para novas perspectivas e desconstrói as hierarquias culturais que colocaram os ideais europeus em primeiro lugar.
Incorporar mentes negras ao imaginar o futuro inspira e facilita alternativas e soluções para os problemas criados por um presente definido pelo homem branco, assim como o futuro para o qual este presente caminha atualmente.
É como explica o reverendo Andrew Rollins: “O estado de consciência de uma pessoa negra é libertado da mentalidade escrava e colonial que confina e incapacita e passa a perceber as infinitas possibilidades e probabilidades do universo".
Outro exemplo é a ficção científica de Nnedi Okorafor, autora da trilogia afrofuturista Binti. Ela pode contar uma história diferente pois, como Okorafor afirma, “minha ficção científica possui ancestrais diferentes - africanos”.
Ao abraçar e celebrar o passado africano e negro, os criativos afrofuturistas contribuem na construção de um presente mais próspero, que levará a um futuro ainda mais próspero.
Criatividade acima do poder
O termo Afrofuturismo apareceu pela primeira vez em um ensaio intitulado Black to the Future, de Mark Dery. Em resposta a entrevistas com criadores negros, ele questionava se “uma comunidade cujo passado foi deliberadamente apagado, e cujas energias foram posteriormente consumidas pela busca de vestígios de sua história, poderia imaginar futuros possíveis”.
O Afrofuturismo mostra o poder de recordar e respeitar a nós mesmos e nosso passado. Oferece uma oportunidade de prestar contas com antigas e atuais questões sobre raça, justiça, criatividade e espiritualidade de uma forma que os mais poderosos muitas vezes não foram capazes.
Define, de forma desafiadora, a criatividade e a imaginação como as grandes ferramentas para enfrentar os maiores desafios do planeta e celebra genuinamente a cultura e o futuro negro, permitindo que sejamos esperançosos em relação ao que está por vir.
Afrofuturistas atuais
O arquiteto Diébédo Francis Kéré criou grandes instalações em galerias ocidentais, como o Pavilhão Serpentine em Londres. No entanto, suas realizações mais impressionantes são as inúmeras escolas e demais projetos, aclamados em seu país de origem, Burkina Faso, combinando métodos e materiais de construção tradicionais com engenharia high-tech.
Christian Benimana e Kunlé Adeyemi são outros dois arquitetos africanos que se conectam com suas origens para construir novos conceitos e edifícios.
Benimana ressalta, no entanto, que o continente precisa de mais qualidade na educação, pois a atual situação praticamente obriga os melhores estudantes a estudarem no exterior.
Designers de moda e artistas como Cyrus Kabiru e Trevor Sturrman utilizam materiais regionais para criar. Cyrus Kabiru reaproveita o lixo que encontra nas ruas de sua cidade natal no Quênia para projetar seus óculos, que incitam a perceber o lugar sob uma nova perspectiva.
E, para muitos, o Afrofuturismo começou na década de 70 com o grupo musical Sun Ra & His Arkestra, mas os videoclipes, sons, letras e aspirações de Missy Elliott, Kendrick Lamar e Janelle Monáe continuam a honrar seu legado.
O Afrofuturismo e seu significado está em constante evolução. É, no entanto, um exemplo capaz de oferecer esperança a pensadores e criativos de todo o mundo.
Versão em português de @ntams.
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