@isaque_criscuolo
Como Tetris se mantém relevante e criativo desde os anos 80
Conheça a história do jogo de origem soviética que influencia e inspira milhões de gamers em todo o planeta
O ano é 1989. A japonesa Nintendo lança o Game Boy, um console portátil que em pouco tempo dominará o mundo. O grande responsável pelo sucesso do console será um jogo simples e viciante que conquistará o coração de milhares de crianças e adultos: Tetris.
A versão de Game Boy de Tetris vendeu 35 milhões de unidades, alcançando a marca de um dos jogos mais vendidos do planeta. A sinergia entre hardware e software, assim como a facilidade de aprendizado, contribuiram para o sucesso e influência cultural que dura até hoje com novas versões do jogo, experimentações e campeonatos.

As origens de Tetris: da USSR aos EUA e Japão
Mas, vamos ao início. A história do jogo começa em 1984, quando o engenheiro soviético de software, Alexey Pajitnov, trabalhava nos testes de um novo tipo de computador, o Electronika 60. Alexey desenvolveu um jogo simples baseado num clássico de sua infância, o Pentaminó, cujo objetivo é encaixar peças geométricas corretamente numa caixa de madeira até completá-la.
O engenheiro removeu um dos blocos do jogo e nomeou a sua invenção com o prefixo quatro em grego: Tetris. Em Tetris, cada peça é formada de quatro quadrados e o objetivo é formar linhas completas unindo estas peças. A complexidade aumenta na mesma medida da velocidade. E este é o gameplay.
Depois de criar o jogo, o grande desafio de Alexey foi levar sua propriedade intelectual além da União Soviética, que proibia qualquer contato de seus cidadãos com o mundo ocidental, geralmente associado aos Estados Unidos da América.

No entanto, a genialidade de sua criação foi além das fronteiras soviéticas para conquistar outros engenheiros, programadores e empresas interessadas na compra dos direitos do jogo. O público, que começava a descobrir o universo dos videogames, precisava conhecer Tetris. E, apesar das dificuldades e burocracias, não demorou para o game alcançar o mundo ocidental como a primeira criação russa a romper os limites da guerra fria e influenciar criativamente milhares de pessoas.
Isso aconteceu graças a dois nomes. Primeiro Robert Stein, representante comercial da Andromeda, que entrou em contato com Alexey, em 1986, para lançar o jogo comercialmente em PCs. As negociações com o governo russo duraram quase dois anos, culminando num lançamento em 1988 para os mercados do Reino Unido e Estados Unidos da América.
O segundo é Henk Rogers, desenvolvedor holandês que vivia no Japão e convenceu a Nintendo de que este era o jogo perfeito para o Game Boy. O console estava prestes a ser lançado na América do Norte e Europa e a ideia de Henk era empacotar uma cópia do jogo na caixa, prática comum fora do Japão. A iniciativa envolveu uma viagem a Moscou na qual Rogers foi questionado pela inteligência russa, mas uma semana depois voltava ao Japão com um contrato assinado.

Durante 10 anos, entre 1985 e 1995, o jogo foi de propriedade intelectual da União Soviética e seu criador, Alexey Pajitnov, não recebeu royalties. Foi somente a partir de 1996, quando Alexey mudou para Seattle com a ajuda de Henk Rogers, que o engenheiro fundou a Tetris Company e passou a usufruir os lucros de sua criação.
Ainda antes desse momento, Tetris foi o primeiro videogame a ser jogado no espaço. Em 1993, o cosmonauta Aleksandr A. Serebrov levou o jogo a bordo do foguete Soyuz TM-17 até a estação espacial MIR, marcando a ocasião em que o Game Boy também chegava pela primeira vez às estrelas.
O surgimento do Game Boy e a massificação de Tetris
"A versão do Game Boy é o Tetris que as pessoas conhecem e amam desde a infância. Três décadas após seu nascimento, o jogo permanece vivo em tablets, laptops, smartphones, consoles de jogos e muito mais. Estima-se que as dezenas de versões oficiais do Tetris geraram mais de US$ 1 bilhão em vendas ao longo do tempo e o legado do jogo influenciou diretamente os criadores de sugadores de tempo e dinheiro como Bejeweled e Candy Crush Saga", diz o jornalista Dan Ackerman no livro The Tetris Effect, publicado em 2016.
Uma dessas pessoas influenciadas pela nostalgia é Claudio Prandoni, jornalista de entretenimento e coordenador de comunicação da LevelUP Brasil, que em 1993 jogou Tetris pela primeira vez.

"De cara o jogo me conquistou, mas também ganhou a atenção do meu irmão mais novo e do meu pai e aí passamos a dividir o videogame para todo mundo conseguir jogar. Tetris é, até hoje, uma das minhas séries favoritas e sempre fico de olho em novas versões. Acho o game design do jogo bem simples e elegante", diz.
É justamente este game design elegante e refinado, capaz de balancear conceitos simples e complexos, que faz de Tetris um jogo capaz de se manter relevante há 37 anos enquanto se reiventa com novas propostas.
Uma delas é Tetris 99, a favorita de Prandoni. "Tetris 99 leva o game para um ambiente competitivo intenso baseado nos 'Battle Royale' tão populares hoje em dia, como Fortnite e PUBG. Tenho carinho especial também pelo Tetris do Game Boy e o Tetris DS, do portátil Nintendo DS, que revigorou bastante a mecânica do jogo com vários modos malucos e crossovers com personagens da Nintendo", afirma o jornalista.

A versão clássica para o Nintendo Entertainment System, de 1989, é também colocada num lugar especial e utilizada como base do Classic Tetris World Championship, campeonato criado em 2010 que elege, anualmente, o melhor jogador de Tetris do mundo.
É preciso dominar o clássico para ser reconhecido.

Recentemente, também foram lançados Tetris Beat, que oferece dinâmicas de jogo sincronizadas com músicas e ritmos, e Tetris Effect: Connected, que usa a fórmula clássica mixada com novos visuais, efeitos e modo online.
Ao todo foram lançadas mais de 70 versões em diferentes plataformas ao longo dos últimos 37 anos.

Tetris: influenciando a cultura pop... e outros games
Tetris exerce uma influência constante na cultura pop e no universo dos games, mantendo-se atualizado a tendências e novas maneiras de aproveitar a fórmula clássica.
Para o ilustrador brasileiro Raul Aguiar (@raul_aguiar), que na Domestika ministra o curso Ilustração vetorial original com Adobe Illustrator, este é o grande puzzle game de nossa época. "Mesmo hoje, vemos sua influência em jogos de sucesso como Candy Crush e Two Dots, que tem a direção de arte de outro professor da Domestika, Owen Davey (@owendaveydraws)", detalha.
A lógica de Tetris brinca com nosso cérebro ao criar desafios visuais em que cada peça ajuda numa pequena solução, cujo objetivo final é manter tudo organizado, sob controle. Estudos com jogadores de Tetris mostram que as pessoas preferem girar os blocos para ver se vão caber, em vez de pensar se vão caber. Tetris cria um mundo onde a ação é mais rápida do que o pensamento, por isso é tão cativante.

Do ponto de vista estético, Tetris possui um trabalho refinado, melhorado ao longo do tempo e capaz de influenciar grandes movimentos como a pixel art, mantida no centro da dinâmica do jogo.
"O design do jogo estimula muito o lado visual, tem até estudos que falam sobre o 'Efeito Tetris', em que as pessoas visualizam pecinhas de Tetris em qualquer lugar após jogar muito. Nos últimos anos também sinto que a empresa dona da marca trabalhou bem a franquia, estabelecendo cores para cada tipo de pecinha e fazendo vários licenciamentos que reforçam bem todo o lado visual do game", realça Claudio Prandoni.
Dicas para superar os desafios de criar um game
Raul Aguiar é o criador do personagem Timo, que também tem um game, e diz que Tetris lhe mostrou que nem todo jogo precisa de personagens ou narrativa, desde que a jogabilidade seja primorosa e os gráficos concisos. Para seu traço autoral, a maior influência é Bomberman, que considera um descendente indireto de Tetris.
Para Aguiar, criar a versão gameficada de seu personagem não foi tão diferente de qualquer outro projeto pessoal, mas para desenvolver Timo the Game precisou voltar a trabalhar em equipe, algo que não fazia há muito tempo. "Por sorte tive apoio da Webcore Games, estúdio bem legal de São Paulo. Tive liberdade criativa e adorava as reuniões de brainstorm com a equipe. Me senti bem leve criando, e é algo que estou vivendo novamente, pois atualmente estamos desenvolvendo a nova versão do Timo. Acho que o maior desafio que tivemos foi desenvolver um projeto ambicioso com uma equipe pequena. Tivemos bastante trabalho, mas curti demais o game final!", conta.

Para ilustradores que querem trabalhar com games, Raul dá duas dicas. Primeiro, que existem oportunidades para ilustradores com traços autorais. Afinal, jogos independentes têm explorado propostas visuais bem interessantes e propostas como Superbrothers: Sword & Sworcery, Gris e Night in the Woods se destacam especialmente pelo visual distinto."Hoje não importa tanto o estilo, mas se você guia o seu trabalho nessa direção", salienta.
A segunda dica é que você não deve esperar que uma empresa de game veja o seu Instagram e faça um convite. "A iniciativa tem que ser sua. No meu caso, inscrevi o Timo no edital KOHQ do SPCine e, junto com o apoio da Webcore, ganhamos o concurso. Minha dica seria de direcionar seu portfolio (mesmo inventando um game fake) e entrar em contato com o máximo de empresas, game designers, game artists legais que você conseguir encontrar e mostrar o seu trabalho", conclui.

Independentemente da versão de Tetris que você conhece ou joga, os conceitos que fizeram do jogo o que é hoje permanecem inalterados. Se trata de um jogo atemporal capaz de engajar dos jogadores casuais aos mais dedicados e competitivos.
"A simplicidade e eficiência de Tetris são os segredos do sucesso do game até hoje. O jogo é definição perfeita de uma frase que já até virou clichê no mundo dos games: 'fácil de jogar e difícil de dominar", conclui Claudio Prandoni.
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