
@isaque_criscuolo
O que é xilogravura e quais são suas aplicações?

Descubra as origens da técnica de impressão, como se aplica e os materiais básicos para começar a gravar na madeira
A xilogravura - ou xilo como também é conhecida - é uma técnica de impressão criada pelos chineses no século VI, passando pelo Japão, Europa, Brasil, país onde tem especial relevância, e daí ganhando o mundo.
Nesta técnica manual, a madeira serve como base para a criação de uma matriz, que será reproduzida com tinta em papel, ou outros materiais, como um carimbo.
A palavra xilogravura tem origem no grego, composta pelos termos xilon e grafó. Respectivamente, significam madeira e o ato de gravar ou escrever. Simplificando, xilogravura é uma gravura feita com uma matriz de madeira.

Apesar da matéria prima relativamente simples, este é um método longo que exige tempo, atenção e dedicação. Afinal, é necessário criar a matriz artesanalmente, uma por uma.
Origem da xilogravura
As informações mais confiáveis a respeito das origens da xilogravura mostra que os chineses utilizavam a técnica para imprimir orações budistas, cartas de baralho, papel-moeda e estampar tecidos. Os registros datam de 220 D.C., enquanto no Japão a xilogravura começou a ser utilizada em 770 D.C. para estampagem de talismãs.
Foi através da xilogravura que surgiram os primeiros livros impressos da humanidade, muito antes da prensa de Gutenberg. Sutra Diamante, editada por Wang Chieh, foi publicado 587 anos antes da Bíblia de Gutenberg.

Na Europa, as primeiras impressões xilográficas foram utilizadas para estampar tecidos. O fragmento de matriz mais antigo foi encontrado na Borgonha, próximo a Dijon, França, com data entre 1370 e 1380.
Entre os séculos XIV e XV, xilogravuras de imagens sacras e cartas de baralho começaram a ser produzidas em grande escala. Antes, tais cartas precisavam ser desenhadas e coloridas uma a uma, tornando o processo lento e caríssimo, mas as reproduções pelo sistema xilográfico baratearam sua produção e venda.

No Japão, a xilogravura já era uma técnica milenar antes de marcar de forma extraordinária os séculos XVII ao XIX. Os artistas mais famosos foram Utamaro Kitagawa (1753-1806), Hokusai Katsushika (1760-1849) e Utagawa Hiroshige (1797-1858).
Era comum também que obras xilográficas japonesas fossem trabalhos coletivos. Um artista desenhava e a equipe se dividia na tarefa do entalhe das matrizes e impressões.


A influência da xilogravura japonesa no Ocidente
As xilogravuras japonesas chegaram ao Ocidente dando origem ao Japonismo, inspirando artistas como Claude Monet, Edouard Manet, Edgar Degas, Georges Seurat, Mary Cassatt, Henri Matisse, ou Vincent van Gogh.
Este último foi um dos mais reconhecidos amantes da estética e da arte tradicional japonesa, que teve grande influência em sua obra. Van Gogh se sentia especialmente atraído pela arte ukiyo-e, as xilogravuras. Em pouco tempo, o pintor se tornou um ávido colecionador de gravuras japonesas. Em 1886, em apenas dois meses, comprou 660 xilogravuras.

Suas peças favoritas não eram as mais caras, mas sim aquelas com cores e padrões ousados. Van Gogh colocava essas obras em seu estúdio e as contemplava constantemente.
Com o passar do tempo, assimilou certas características estilísticas em seu próprio trabalho. Sua pintura ganhou cores mais vivas e incluiu padrões decorativos.

Outro nome importante na xilogravura europeia é o inglês Thomas Bewick, que foi um dos primeiros precursores da chamada xilografia de topo.
Esta técnica é uma variação que permite mais riqueza de detalhes e levou a xilogravura para ilustrações de jornais, livros e revistas.

Xilogravura e estampagem têxtil
Atualmente, a xilogravura é muito praticada na criação de estampas através de Block Print, uma técnica de estampagem têxtil que utiliza blocos de madeira esculpidos manualmente como carimbos.
A estampagem, também manual, é feita a olho, alinhando cada bloco no tecido de forma a criar um padrão. É uma das técnicas mais antigas de impressão e tudo indica ser original da China, onde foram encontrados os exemplares mais antigos, em seda, que datam do ano 220 d.C.
O Block Print oferece um método simples e fácil de impressão e criação de padrões em tecido, por isso é utilizada até os dias de hoje, sendo na atualidade mais associada à cultura indiana por aí continuar a ser um método bastante comum.
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Xilogravura no Brasil - Arte e Literatura de Cordel
No Brasil, os índios já utilizavam matrizes de madeira para imprimir desenhos rituais na pele e estampar vestimentas. As etnias canelas, apinajés e xavantes são bons exemplos da prática.
No entanto, na época em que a Coroa Portuguesa trouxe a imprensa ao Brasil, todos os xilógrafos eram estrangeiros. Somente com a criação em 1872 do Liceu de Artes e Ofícios é que surgiram os primeiros xilógrafos brasileiros.
Os precursores da xilogravura no Brasil foram Lasar Segall (1891-1957), Oswaldo Goeldi (1895-1961) e Lívio Abramo (1903-1992), influenciados pelo movimento expressionista. Mas poucos influenciaram tão decisivamente as gerações seguintes quanto Fayga Ostrower.

Fayga, gravadora, pintora e crítica de arte, foi também professora no Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro a partir dos anos 1950, quando a instituição carioca, então recém-inaugurada em 1948, ocupava o centro do pensamento modernista nacional. Ali, ajudou a implementar um conceito de museu-escola que rompia as fronteiras entre passado e presente, apresentando o processo de criação como um fluxo contínuo e tornando o espaço de exibições um anexo do bloco de aprendizagem, mais vivo e pulsante.
Ostrower deu aulas a Anna Bella Geiger e Lygia Pape, por exemplo, e incutiu nelas e nos seus outros alunos a necessidade de buscar um rigor artístico, um método de criação, sem se deixar prender por formalismos ou ideias preconcebidas.
Abstrata “radical” num momento em que seus pares eram quase todos figurativistas, Fayga foi, antes de tudo, uma libertária e embora a principal parte de sua obra tenha se concentrado na produção de gravuras (xilogravuras, gravuras em metal, litografias e serigrafias), desenhos e aquarelas, ela experimentou outras técnicas, como a concepção de grandes murais, a esmaltação de metais, o desenho de joias, a criação de cartazes, capas, ilustrações de livros e discos e a padronagem de tecidos.

Curiosamente, foi na Literatura de Cordel, gênero literário popular escrito em rimas, que em meados do século XX a xilogravura ganhou o centro das atenções. As histórias populares passaram a ser publicadas em folhetos impressos principalmente com xilo, com o pico de sua produção entre 1930 e 1940.
A xilogravura de cordel conta com grandes nomes como Abraão Batista, José Costa Leite, J. Barros, J. Borges, Jerônimo, José Costa Leite, José Pacheco, Marcelo Soares, Mestre Dila (José Soares da Silva), Stênio e José Lourenço.


Materiais básicos para xilogravura
O espanhol Pablo Salvaje (@pablosalvaje) é um ilustrador e gravador de selos, que na Domestika ministra os cursos Gravura em relevo e estampagem contemporânea e Escultura de carimbos e técnicas de estampagem.
Pablo uniu sua paixão pela tinta, o papel e a ilustração com o antigo negócio de impressão da família e se especializou em diversas técnicas de gravura, design, ilustração e serigrafia. Tendo a natureza como musa, o artista pretende deixar uma marca, de maneira literal e figurada, com cada uma das suas peças.

Para fomentar a criação com essas técnicas, Pablo Salvaje compartilha uma lista com algumas ferramentas básicas e ao alcance de todos, para que você possa começar a trabalhar com xilogravuras. Todas são fáceis de encontrar e de trabalhar e assim, você pode pôr mãos à obra com as ideias que tiver em mente.
Estes são os materiais básicos, mas alguns podem ser opcionais e dependem da ideia que você quer desenvolver. Lembre-se que você pode buscar e usar sua criatividade para encontrar outras ferramentas que permitam dar volume e criar com o que tiver ao redor.
Goiva
A ferramenta mais importante para talhar. Deve se adaptar às suas necessidades e ao material com o qual vai trabalhar.
Lápis
É essencial ter um 2HB, para que deixe a quantidade de grafite necessário no papel vegetal. Um H seria muito duro, você não veria muito bem o esboço, e o B muito mole.
Estilete de precisão
Para realizar os cortes pertinentes e atingir cantos mais complicados.

MDF
Para você trabalhar com suas matrizes nele. É fácil de achar, mas você também pode utilizar um pedaço de madeira nobre.
Papel especial
Necessário para a estampa. Pode usar um papel de seda ou qualquer específico para xilogravuras. Depende do resultado e textura que você quer obter.
Papel vegetal
Para passar o seu esboço, fazer o cálculo e transferi-lo à matriz.

Tecido
Pode ser qualquer um que você tiver em casa. Não precisa ser de grande qualidade, já que você apenas fará alguns testes para que a matriz fique cheia de tinta.
Tinta de gravura
Se utiliza tanto no papel como no tecido. Pablo sugere a marca Speedball, uma marca internacional fácil de encontrar.
Rodinho
Você usará para a tinta e não precisa ser nenhum específico.
Objetos naturais
Úteis para obter texturas. Use sua imaginação e o que tiver em casa.

Gostou de saber mais sobre a xilogravura? Se quiser descobrir outros materiais e ferramentas para começar, confira este artigo. E se desejar aprofundar seus conhecimentos na área da estampagem, não perca os cursos da Domestika, ministrados pelos melhores especialistas!
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1 comentário
Adorei a matéria sobre xilo