Introdução à escrita de histórias de terror juvenis

Regina acordou do frio. O vento gelado tinha entrado em seus ossos, e a dor úmida e lancinante em suas costas a fez levantar do chão. Que horas seriam? Ele olhou pela janela. Ainda estava escuro lá fora, embora o céu começasse a adquirir um tom avermelhado que lhe causou um arrepio involuntário ao pensar que era apenas a cor da poeira que se espalhava por toda aquela maldita cidade. Ele sentiu fome. Sua boca estava seca. Lembrou-se do desjejum que tinham recebido no rancho... há quantos dias? Dois? Três? Suas papilas gustativas recriavam fielmente a sensação de feijão e queijo, ele podia até evocar o cheiro de tortilhas recém-feitas, a sensação da névoa de café acariciando a ponta de seu nariz. Ele parou de se torturar com a memória quando ouviu alguém tossir. Charlie. Era a mesma tosse seca e áspera do dia anterior, interrompida de vez em quando pela respiração ofegante e ofegante. "É muito ruim", uma voz sussurrou atrás dele. Foi Óscar. Regina assentiu, preocupada. Pensou no que haviam lido no dia anterior nos relatórios médicos. "Temos que acordar os outros", disse ela. Um raio de sol entrou pela janela e caiu direto no rosto de Charlie. Liliana engasgou: a pele do menino estava seca e rachada, como barro. Das rachaduras ao longo de seus lábios, testa e bochechas, escorria sangue grosso e escuro que coagulou quase imediatamente. "Ele está se tornando um deles", explicou Oscar. "Não fale besteira", Joserra trovejou. "Eles não são besteiras", Regina se atreveu a contradizê-lo. Foi a primeira vez que ela foi contra ele em qualquer coisa e ela sentiu seu rosto queimar de vergonha. E o frustrou sentir-se envergonhado por algo assim, sabendo que ele estava certo. Ele tentou parar de analisar tudo demais e continuou. Está nos arquivos que encontramos ontem. Quando a luz do sol é mais forte... Ele não podia dizer isso. Horror e tristeza entupiram sua garganta em igual medida. Com isso, Charlie tentou falar, mas só conseguiu um longo acesso de tosse que o fez dobrar. O suor brotou em sua testa com o esforço, e Regina teve o cuidado de não mencionar que o suor também era avermelhado e espesso. Toda vez que Charlie tentava inalar, um silvo crepitante subia de sua garganta de seu peito. Bruno derramou um pouco de água nos lábios. Embora tivessem muito pouco, ninguém se opôs ou reclamou. Charlie bebeu avidamente e, depois de um momento, forçou-se a respirar fundo. "Pegue... me pegue," ela disse em voz baixa. Outro acesso de tosse o interrompeu. Demorou mais para recuperar o fôlego. "Eu... eu não quero... machucá-los", ele finalmente conseguiu ofegar. Joserra empalideceu. "Isso realmente vai se transformar em uma dessas coisas?" ele perguntou com desgosto. "Tire-me daqui... tire-me daqui... eu mato esse aqui", brincou Charlie, com uma expressão muito triste. Oscar e Bruno trocaram um olhar rápido e, sem dizer nada, cada um pegou Charlie pelo braço e o ajudaram a chegar à porta. O som que Charlie fez enquanto tentava colocar oxigênio em seus pulmões era o de pedras esmagando areia. Seus olhos, injetados naquele sangue enegrecido e coagulado, estavam opacos, as pupilas transformadas em dois pontinhos. "Cheira a lama", murmurou Liliana. "Não, não é lama," Regina disse suavemente. Isso é… Ele não se atreveu a dizer isso. Era o cheiro de uma fossa séptica, de um canal de esgoto. Ele sentiu que era o fedor dos órgãos internos de Charlie, em decomposição pela ação dos esporos. Chegando à porta, um novo ataque de tosse fez Charlie ficar de quatro, sem que Oscar e Bruno pudessem detê-lo. Charlie então vomitou um longo líquido viscoso vermelho escuro. Então, exausto, ele caiu no próprio vômito e convulsionou novamente. Por pudor, por piedade, todos desviaram os olhos, até que Joserra gritou: "Feche a porra da porta já!" Regina se virou para olhá-lo. Ela percebeu que Joserra estava prestes a chorar e sentiu novamente que a ternura por ele a inundou. Era absurdo, mas ele não podia evitar. "Não brinque com ela, Joserra", respondeu Bruno. Ele é nosso companheiro, nosso carnal. Pelo menos espere até termos certeza de que… -Perto! Liliana gritou, apontando um dedo trêmulo para Charlie. E o fato é que, enquanto todos se voltavam para Joserra, Charlie havia se levantado, e agora dava um passo lento, muito lento, como se acabasse de descobrir a relação entre seus ossos e seus músculos e tendões, como se pouco a pouco provam que o pé e a panturrilha, a coxa e o tronco estavam realmente ligados. Mas aquela coisa que se levantou e estava andando em direção a eles não era Charlie. Seu rosto não parecia mais ressecado e rachado, mas esculpido na rocha. Ele estava completamente inexpressivo e, ao mesmo tempo, exalava um ódio profundo e perigoso. Como se estivessem acordando de um sonho, Bráulio e Oscar entraram no prédio e fecharam a porta. Eles se encostaram nela, tentando mantê-la firme sem fazer barulho, enquanto as lágrimas banhavam seus rostos. O que antes era Charlie agora estava batendo na porta e rugindo com um som que parecia vir das entranhas da terra. E então... silêncio. Alguns minutos depois, pela janela, os adolescentes puderam ver como o que tinha sido Charlie estava agora debruçado sobre um monte de poeira para levar um punhado de terra avermelhada à boca, e depois outro, e outro. Então ele se endireitou e tropeçou para se juntar a um grupo de monstros que se afastavam em direção à praça principal da cidade.