Ilustração

6 marcos na evolução da ilustração científica

Descubra como desenhos que mostram detalhes de animais, plantas e outros seres vivos têm uma tradição milenar

Por milênios, foi a forma mais eficaz de transmitir detalhes técnicos aos estudiosos do corpo humano e da natureza. Mas, o advento da fotografia, no século XIX, parecia condenar a ilustração científica a virar história. Não foi assim.

Ainda forte, essa disciplina que mistura arte, sensibilidade, conhecimentos científicos e anatômicos apurados e muita disposição para a pesquisa vive uma espécie de redescoberta.

“É uma bela disciplina, na qual prima o olhar do autor. Pode-se fotografar, claro. Mas ilustrar dá muita personalidade. Se alguém vai investigar um tema de certas plantas, mas, em vez de foto, encontra ilustração, se depara com algo muito único, muito próprio. É outra sensibilidade, outra empatia”, descreve a pintora, ilustradora e muralista argentina Lucila Rodríguez.

Ilustrações da pintora, ilustradora, muralista e professora da Domestika, Lucila Rodríguez
Ilustrações da pintora, ilustradora, muralista e professora da Domestika, Lucila Rodríguez

Dona de um estilo extremamente detalhista, fidedigno, quase científico, ao mesmo tempo em que transborda criatividade na escolha das cores, dos detalhes que quer ressaltar, Lucilia, que na Domestika ministra o curso Pintura botânica com acrílico, relembra os convites que recebeu para fazer livros de ciências.

“Durante meus anos de estudo, estive investigando o corpo humano, o orgânico. Meu olhar é essencialmente artístico. Mas, respeito demais quem tem um approach eminentemente científico. Tenho certeza de que essa arte ainda vai durar muito tempo”, ela continua.

Seis marcos da ilustração científica traçam uma linha clara entre a pré-história e a contemporaneidade. E fazem crer que o vaticinio de Lucila Rodríguez se cumprirá. Confira na sequência!

1. 'Ciência' rupestre

Porcos, búfalos e humanos nas paredes de cavernas da ilha de Sulawesi, na Indonésia, mostram que a ilustração científica e a arte humana nasceram juntas.

Precisamente há 44 mil anos, segundo cientistas australianos e indonésios que usaram marcação de carbono para datar o local.

Pintura rupestre de mais de 8 mil anos de idade encontrada no parque Kakadu, Austrália
Pintura rupestre de mais de 8 mil anos de idade encontrada no parque Kakadu, Austrália

Em cavernas como a de Lascaux, na França, Altamira, na Espanha, ou do Parque da Serra da Capivara, no Piauí, bisontes, lagartos, lobos ou gado refletem o desejo humano, desde o início da civilização, por retratar o ambiente e os seres ao redor.

Feitos com tinta obtida de pigmentos vegetais e minerais e preservados em ambientes escuros e livres de umidade, esses registros pré-históricos tiveram melhor destino que muitas das ilustrações científicas mais avançadas feitas milênios depois e registradas em papel, que desapareceram, caso dos desenhos de Cláudio Galeno, tema do tópico 3.

2. Faraó Quenquenés e Escola de Alexandria

Como em muitos temas relacionados ao Antigo Egito, há uma mistura de registro histórico e lenda quando se fala nos primeiros estudos anatômicos dessa rica civilização.

O historiador egípcio Manetão, que viveu em Alexandria durante o período helenístico, no terceiro século antes da era comum, escreveu na sua famosa obra Aegyptiaca que o faraó Djer, também conhecido como Quenquenés (cerca de 3.000 a.C), foi um anatomista, o que o tornaria um dos primeiros especialistas nesta ciência de que se tem notícia.

Fragmento do "Livro dos Mortos", escrito por volta de 1.540 a.C. Acervo: British Museum
Fragmento do "Livro dos Mortos", escrito por volta de 1.540 a.C. Acervo: British Museum

Durante o reinado dele, a anatomia de fato floresceu, e um tratado escrito no período sobreviveu por mais de dois mil anos, sendo referência ainda no período em que Manetão viveu.

Mais ou menos contemporâneos do historiador, os médicos e anatomistas Herófilo e Erasístrato, ambos membros da chamada Escola de Alexandria, são tidos oficialmente como pioneiros das autópsias e da dissecação de cadáveres humanos.

3. Cláudio Galeno

Apesar de estudiosos chineses, persas e egípcios – como o grande polímata Imhotep (2.655-2600 a.C) – terem produzido material científico de notável qualidade há milhares de anos, os estudos do sábio grego que viveu no século II da nossa era foram tão acurados que o fazem ser considerado um dos maiores médicos e anatomistas da Antiguidade, comparável a Hipócrates (460-370 a.C), o “pai da medicina”.

Tratado anatômico do século XIII baseado em ilustrações e relatos de Cláudio Galeno
Tratado anatômico do século XIII baseado em ilustrações e relatos de Cláudio Galeno

Cláudio Galeno dava espetáculos públicos em teatros lotados, na sua Pérgamo natal e também em Roma, nos quais fazia autópsias, dissecações e vivissecções que atraíam grande atenção.

Foi médico particular do imperador Marco Antonio e sedimentou a teoria hipocrática dos humores, que determinariam os estados de saúde e enfermidade humanos e perdurou até o século XVI. Deixou um grande legado de ilustrações científicas documentado por outros historiadores.

As originais, como já dissemos, não chegaram aos nossos dias.

4. Leonardo Da Vinci

Com o gênio renascentista, um dos mais célebres polímatas da história, a ilustração científica experimentou um salto sem precedentes.

A riqueza de detalhes dos desenhos de Da Vinci, obtidos diretamente por ele de dissecações que conduziu ou acompanhou, não tem paralelo no seu tempo nem antes dele.

Leonardo Da Vinci
Leonardo Da Vinci

Com o gênio renascentista, um dos mais célebres polímatas da história, a ilustração científica experimentou um salto sem precedentes.

A riqueza de detalhes dos desenhos de Da Vinci, obtidos diretamente por ele de dissecações que conduziu ou acompanhou, não tem paralelo no seu tempo nem antes dele.

Leonardo Da Vinci
Leonardo Da Vinci

Criações de Da Vinci ajudaram a medicina a entender o funcionamento do coração, do sistema circulatório e do sistema reprodutivo, além de aportar novas luzes sobre os ossos e a musculatura.

Tão à frente do seu tempo foi esse gênio que seus esboços inspiraram, séculos depois, a representação pictórica da mecânica moderna e da geometria descritiva, além da robótica.

5. Darwin, o esplendor do século XIX e a revista Nature

A Ilustração – e a progressiva substituição de Deus pelo homem como centro do universo e foco do saber – levaram ao surgimento de gerações de grandes ilustradores científicos que, ao longo dos séculos XVII, XVIII e XIX, deram a essa disciplina o seu apogeu.

Ilustrações científicas de manual do século XVIII
Ilustrações científicas de manual do século XVIII

Um dos cientistas mais famosos de todos os tempos, o inglês Charles Darwin, autor da teoria da evolução publicada na obra A origem das espécies, foi, ele mesmo, um grande ilustrador científico.

Suas séries sobre Galápagos figuram até hoje nos anais da ilustração e se destacam por seu incrível nível de detalhes e a sensibilidade de que falava a professora Lucila Rodríguez no início deste texto.

Fringilídeos de Darwin, 1845
Fringilídeos de Darwin, 1845

Manuais inteiros dedicados à botânica, à ornitologia e à anatomia humana ganharam status de obras populares, extrapolando os círculos científicos e convertendo-se em temas de tertúlias e encontros sociais da burguesia ilustrada no século XIX.

Em 1869, uma das pioneiras revistas científicas, a Nature, chegou ao mercado, com um primeiro número exclusivamente composto por textos e ilustrações.

Se, ao longo das décadas seguintes, a fotografia foi se incorporando cada vez mais ao leque de recursos dessa e de outras publicações, a ilustração jamais perdeu seu merecido lugar.

Logo do primeiro número da revista "Nature", em 1869
Logo do primeiro número da revista "Nature", em 1869

"O século XX viveu um boom de publicações científicas. Nelas, as tecnologias fotográficas foram adquirindo um papel central, mas os conteúdos visuais se mantiveram diversos e incluíam ilustrações, gráficos e protoimagens digitais", descreveu Geoffrey Belknap, em 2019, num ensaio para comemorar os 150 anos da Nature.

6. Frank Netter, o século XX... e além

O famoso médico americano, morto em 1991, foi autor de um sem-número de manuais e guias médicos ao longo de sua extensa carreira.

Adquiridos pelo laboratório Novartis depois da sua morte, e revendidos à editora acadêmica Elsevier, seus livros, entre eles o clássico Atlas de Anatomia Humana, foram o primeiro contato de gerações de leigos com o saber científico através de ilustrações.

Alguns ainda continuam a ganhar edições, e as criações de Netter são usadas em artigos e outras publicações científicas.

Frank Netter
Frank Netter

Além de Netter, muitos outros grandes profissionais contribuíram para manter a ilustração científica viva nas últimas décadas.

Multiplicam-se carreiras universitárias, escolas politécnicas ou oficinas de iniciação dedicadas ao tema. Prova disso é que o termo “curso de ilustração científica” no mecanismo de busca mais popular na internet tem, só em português, nada menos do que 14,1 milhões de resultados.

Não há qualquer razão para pensar que esse número não continuará a crescer pelos próximos anos e décadas.

E não deixe de explorar mais listas criativas incríveis na seção Top 10 do nosso blog.

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