Perdida em seus olhos
por Nathalia Mageste @nathaliamageste
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Perdida em seus olhos
Max Pellegrine nunca olhava nos olhos de ninguém. Sempre que estava no ônibus escolar, ficava com a cabeça enterrada em seus livros. Tinha preferência pelos últimos assentos, pois favoreciam sua concentração. Principalmente agora, que estava mergulhado em Hamlet de William Shakespeare.
Era uma tarde nublada, talvez a mais sem graça dos últimos meses, quando o transporte escolar mudou a rota. A avenida principal estava interditada pela prefeitura, por tempo indeterminado. O novo trajeto era questionável, com ruas esburacadas e morros, que mais pareciam montanhas-russas.
Max não conseguia prosseguir com a leitura. Sua única opção era olhar pela janela para conhecer o local. Ele raramente se permita descobrir o que existia à sua volta. Foi quando avistou de longe algo se movendo. À medida que o ônibus se aproximava, mais forma a imagem ganhava.
Era ela! Marina Blanc, uma garota comum, com seus longos cabelos castanhos. Sentada sobre um tapete persa, na laje de sua casa. Vestida com o uniforme verde celeste, do colégio Central.
Ela não era notada, mas também não sofria bullying. Não era querida, mas também não era odiada. Ela estava lá, invisível para alguns, mas nítida, e até ofuscante, para quem quisesse ver.
Bebia uma Coca-Cola de lata, enquanto refletia sobre uma discussão com sua mãe. O assunto já estava acabado, mas remoer, poderia distrai-la de sua vida monótona. Subitamente, algo dispersou seus pensamentos.
Que barulho era aquele? Ao encarar a rua, viu um ônibus em seu bairro. Marina notou que lá de dentro alguém a encarava serenamente. Seu coração disparou de repente. Como era possível? Ela não o conhecia.
Mais tarde, a tv local noticiou que a temporada de obras mudaria o itinerário dos ônibus. O mistério acabara, mas e aquele garoto? No dia seguinte, foi ao mesmo local para rever o desconhecido. A troca de olhares foi instantânea. Frequentar a laje, após as aulas, se tornou um hábito. E com Max não era diferente. Vê-la por alguns instantes era tudo o que ele precisava.
De fato, não ocorria uma conversa falada. A comunicação acontecia espontaneamente, com gestos e olhares, o que não deveria durar o resto de suas vidas. Afinal Marina era impaciente. Logo tomaria uma atitude.
Ao fim da aula foi até a papelaria. Chegou em casa portando um canetão preto e uma cartolina. Escreveu com letras irregulares: “Me encontre amanhã na saída do colégio Central”. De longe ouvia o ônibus fazendo a curva. Sem hesitar, levantou o cartaz. Max esboçou um sorriso tímido, acenando positivamente com a cabeça.
Após baixar a cartolina, Marina vibrou silenciosamente. Fantasiou o encontro, criando várias cenas. Ainda que estivesse dispersa, precisava terminar seu trabalho de biologia. Na hora de dormir, sua ansiedade não a deixava pregar os olhos. Passou a noite em claro, saltando da cama, antes que o despertador tocasse.
Esticou os lençóis, tomou um banho e vestiu-se. Para realçar os olhos usou um lápis preto, rente aos cílios. A maquiagem tomou seu tempo, e o café da manhã ficou para trás. Sentiria fome, mas no intervalo, compraria algo na cantina.
Na aula, o professor Gutemberg falava sobre homozigoto e heterozigoto. Sua mente vagava para entender toda aquela esquisitice. As horas não passavam, mas que tormento! Após uma eternidade, aleluia! O sinal finalmente tocou. Hora de se libertar daquela ladainha interminável. Marina entregou seu trabalho, e saiu apressada, sem se despedir das amigas.
Na saída, foi envolvida por um turbilhão de sensações. Respiração irregular, mãos trêmulas e pulsação acelerada. Recostou-se na árvore mais próxima para se recompor. Cada minuto era uma eternidade. Por que ele demorava tanto?
As esperanças minavam... foi quando Max surgiu. Se destacava no meio dos alunos.
Vestia o uniforme da melhor escola da cidade, calça preta e camiseta branca, com o logo estampado. Ventava um pouco, mas o suficiente para bagunçar seus cabelos castanhos. Seus olhos surpreenderam Marina. Olhos de um azul tão profundo, feito um par de águas-marinhas.
Max sorriu e se apresentou gentilmente. Em seguida, perguntou se Marina gostaria de acompanhá-lo a um local tomado pelo doce perfume de dama da noite. Embora explodisse de felicidade, ela aceitou o convite de forma natural.
Enfim, chegaram na praça Apple Garden. Batizada assim, por abrigar uma grande macieira. Max a conduziu até uma pedra gigante. Lá se acomodaram para admirar a paisagem. Ele estava conectado, completamente entregue. O lugar parecia encher-lhe de vida.
As idas de Max à Apple Garden eram restritas à Mabel, sua cadela. A Golden Retriever precisava se exercitar, pois estava acima do peso. Mas era uma graça, com seu lindo laço cor-de-rosa na cabeça. Impossível não acariciá-la! Amável, como de costume, Mabel se deliciava a cada afago recebido. Ao término dos passeios, bebia um pouco de água da fonte para se refrescar. Marina foi o primeiro ser humano que Max levara ali.
Aquela tarde tinha algo especial. Havia um brilho cintilante no ar. Era como se Max olhasse para céu e colorisse todo o espaço, com o azul dos seus olhos. Não havia nuvens, apenas aquela pintura azulada. Como um quadro infinito, esparramado por todo o universo.
Max calculou cada detalhe, para garantir um encontro inesquecível. Estendeu uma toalha retangular branca, com bordado ultrassônico. Em seguida, tirou da mochila duas maçãs, uma garrafa de suco de laranja, dois bombons de avelã e dois sanduiches. Formou-se um piquenique improvisado. Ninguém nunca havia feito algo assim para ela.
Enquanto deliciavam o banquete, trocavam olhares genuínos. Subitamente aproximaram-se, unindo suas testas. Nada poderia afastá-los, nem “Lost in your eyes” da Debbie Gibson. A música tocava no último volume, no som de um carro, estacionado na esquina.
Aquela trilha sonora era perfeita para o momento. Ao cantarolarem uma estrofe, se beijaram. Beijá-lo era como se perder num labirinto e nunca mais encontrar a saída. Seu corpo flutuava, como se desfrutasse de uma dose exagerada de valium. Ninguém nunca a beijara daquele jeito. Ambos estavam em êxtase.
Ainda com as pupilas dilatas, se levantaram para recolher as sobras do lanche. Foram até o banheiro. Max retornou após alguns minutos. Pressionava o nariz com o polegar e o indicador numa espécie de pinça. O papel higiênico também fazia parte da técnica, a fim de conter um sangramento nasal.
Marina se preocupou de imediato. Equilibrado como sempre, Max desconversou como se aquilo não houvesse importância. Um pouco apressado abriu a mochila, tirando um envelope. Entregou a Marina, fazendo-a jurar não abrir antes da hora, ela saberia o momento certo. Marina assentiu com a cabeça. Max deu-lhe um beijo de despedida. Mesmo incerto, prometeu buscá-la no dia seguinte, em frente à escola.
Na quarta-feira, ela o esperava em frente ao portão, conforme combinado. As turmas do próximo período já entravam no colégio. O passar das horas só confirmava que ele não viria. Sem conseguir assimilar a situação, Marina chegou em casa e se trancou no quarto. Ingeriu uma cápsula de prozac, ficando inerte em sua cama, até o próximo dia.
Marina fez uma nova tentativa, na quinta-feira. O episódio se repetiu. O que ela deveria fazer? Ele teria simplesmente desistido dela? Após refletir um pouco, lembrou-se do envelope. Como não pensou nisso antes?! Foi para a casa depressa. Passou por sua mãe feito foguete. Pegou o que precisava e foi direto para a laje.
Ao abrir e envelope, encontrou duas folhas. Ao desdobrar uma delas, Marina viu seu rosto desenhado. Os traços eram perfeitos, como um espelho que a refletia. Max deveria investir na carreira, ficaria famoso. Sem sombra de dúvidas!
A folha seguinte já não carregava o mesmo encanto.
Marina;
Se você está lendo essa carta, foi porque parti. Peço perdão por me despedir tão cedo. Acredite em mim, eu queria poupá-la dessa mensagem... Ainda que eu esteja melancólico e sem forças, lhe devo uma satisfação.
A primeira vez que a vi, foi no Festival de Inverno da nossa cidade. E não em cima da laje, onde eu a reconheci. Não me aproximei no Festival, pois tive uma indisposição. Precisei voltar para casa. Sentado no chão do meu quarto a desenhei. Não poderia deixar que sua imagem se paagasse de minha memória. O desenho ficou sobre minha escrivaninha durante meses. Eu prometi a mim mesmo que o entregaria pessoalmente.
Fiz uma viagem, dias depois, mas lá estava você, em meus pensamentos. Retornei à cidade, e sua presença ficou mais intensa. Eu saía de casa torcendo para esbarrar com você. Nunca aconteceu. Em contrapartida, tinha receio de encontrá-la e me frustrar, caso não partilhasse do mesmo sentimento.
Te encontrei por acaso, e fui correspondido. Fiquei imensamente feliz, porém corria contra o tempo. Minha leucemia podia me levar a qualquer momento. Eu só queria viver ao menos um dia, fingindo não estar à mercê de uma doença incurável. Por isso não te contei!
Peço para que não desista de mim. Prometo zelar por você de onde eu estiver. Mesmo nos dias mais cinzas, olhe para o céu. Lá no horizonte, você vai me encontrar. Vou te confortar para que nunca se sinta sozinha.
Um dia vamos nos reencontrar. Viveremos tudo o que o tempo não nos permitiu viver. É impossível descrever meu sentimento por você.
Como dizia Shakespeare:
É um amor pobre aquele que se pode medir...
As lágrimas pesadas de Marina inundaram as folhas. Ela não queria acreditar no que estava lendo. Deveria certificar-se de que não passava de um mal-entendido. Enquanto relia a carta, um belo arco-íris começou a se formar no horizonte. Marina pausou a leitura para observar aquela obra magistral, cuja faixa azul brilhava intensamente. Seria um sinal?
Ainda transtornada, olhava fixamente para o céu. Marina estava hipnotizada com aquele fenômeno óptico, que a atraia sorrateiramente. Seus pés não obedeciam, e num simples descuido, o que era belo e colorido, foi se apagando. Transformando-se pouco a pouco na mais completa escuridão...
Prof: Shaun:
Meu projeto não é exatamente o que foi pedido, mas eu precisava contar essa história. Até porque alguns fragmentos são reais. Eu só começaria a escrevê-la se encontrasse alguém com tamanha sensibilidade. Por isso, estou aqui.
Esse projeto é apenas um esboço, há muito o que melhorar. Peço que aponte tudo o que encontrar, (falhas e elogios, se os tiver). Preciso de um olhar crítico, já que o trabalho vai para o meu portfolio.
Ficarei feliz com os apontamentos. Muito obrigada!
2 comentarios
shaun_levin
Profesor PlusHola Nathalia, Gracias por compartir tu historia con nosotros. Me gusta una buena historia de amor y disfruté leyendo esto. Me gusta mucho la forma en que te mueves desde el punto de vista de Max al punto de vista de Marina al principio, así que una de mis sugerencias sería hacer lo mismo al final y pasar al punto de vista de Max al final (después de que haya fallecido). Pruébelo, experimente y vea qué sucede :)
Me gusta cómo el autobús cambia de ruta y hay una duda de si se encontrarán. Tal vez le resulte un poco más difícil a Marina averiguar dónde está la nueva ruta de autobús. Tal vez tenga que llamar a la administración de la ciudad, oa la compañía de autobuses, o preguntarle a uno de los vecinos si conocen la nueva ruta. Darles un desafío a tus personajes es bueno para la historia, pero también es bueno para nosotros como escritores, hacer las cosas un poco difíciles para nosotros :) De esa manera, es más probable que nos sorprendan nuestras propias historias, y si ' sorprendido, el lector se sorprenderá.
Me gustan todos los detalles específicos sobre el perro, el profesor y el homocigoto (incluso si no sé qué es eso, le da a la historia una sensación de ser real y crea confianza en el escritor), Apple Garden y el diferentes uniformes escolares. Todos esos detalles específicos agregan textura a la historia. Escribes bien, y la escritura fluye y es clara. Gracias por participar en el curso. ¡Seguir escribiendo!
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nathaliamageste
¡Muchas gracias por los comentarios, profesor!
Estaba muy feliz :)
Haré algunos ajustes a la historia.
Acerca de su cuaderno con fotografías, proporcioné uno también y desarrollé algunas fotos. Pensé que la idea era asombrosa.
Me encantó el curso :)
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