Percepções de um “copo meio cheio”
by Bruna Saliba @brunasaliba
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Percepções de um “copo meio cheio”
- Rosa, o que é Alheira e Rojões?
- Anda cá, menina! Vem ver na cozinha! Tem que experimentar o que é típico…
- Então vou querer!
Rosa é uma mulher de meia idade, dona do bar, garçonete, cozinheira e caixa. Ela tá sempre correndo de um lado pro outro pra conseguir atender sua freguesia (clientes fiéis, que ela chama pelo nome, que vão almoçar lá diariamente). Sempre que nos vê sair do prédio, pergunta como vão as coisas.
Antônio é o senhor da frutaria de baixo, ele recebe diariamente a mercadoria que vem em uma kombi direto do mercado abastecedor, na região de Campanhã. Ele é o mesmo que nos passou o telefone do lugar que pede gás. Vez ou outra oferece morangos ou uvas para degustação. Adora falar sobre o Brasil e como temos sucos naturais tão bons que por aqui não acha.
Hélder é o senhorio, pessoa extremamente atenciosa que está sempre disponível. No natal deixou uma prenda na porta de casa e outra vez colocou um presente no carrinho do bebê. É o mesmo que nos ofereceu miniaturas de vinho do Porto.
Getty é um caso à parte. Queria nos conhecer (amiga da tia do marido, sabe como?) e marcou de nos encontrar na rotunda da Boavista com o seu filho. Nos levaram em uma churrascaria e depois nos convidou para conhecer sua casa em Bragança. Fez bacalhau pra nós e nos apresentou metade da cidade. Até a dona do hotel, que era sua amiga, veio nos receber.
Por aqui a vida passa mais devagar. As confeitarias estão sempre cheias, são idosos e jovens, que param no meio do dia para um café, para uma prosa. Às vezes a gente escuta alguém comentar como a maquininha de cartão veio para tirar o emprego de tantas pessoas (o pagamento é à vista e cada moedinha tem valor) e por vezes comentam como anda a política no Brasil.
O cenário parece acontecer nos anos 80. O tempo aqui parou! Não existe esse negócio de parcelar e fazer dívida. E-commerce é muita modernidade (só os mais jovens usam). Mas essa história toda é só pra dizer que a Rosa, Antonio, Helder e Getty são pessoas reais que tivemos o imenso prazer de cruzar nessa terra chamada Portugal. Povo hospitaleiro e de coração generoso.
É verdade também que a vida de imigrante não é fácil. As aves que aqui gorjeiam, não gorjeiam como lá. Mas tem horas que, por questão de sobrevivência, é melhor olhar para o copo “meio cheio”.
1 comment
shaun_levin
Teacher PlusHi Bruna, I really enjoyed reading this. It reminded me of the piece you wrote about Guimarães, where there were no people in the picture, but here the world of the story is full of people. I like how we get introduced to all the characters, in the same way that Getty introduces the narrator and her family to people in the city. This feels like the groundwork for a much bigger story, maybe even a book... about the different places and the people linked to them. The bitter-sweetness at the end is intriguing, too, as it seems to hint at the possibility that there are other aspects to the story. I agree, the life of an immigrant is not easy. When it's good it can be really wonderful, but when it's challenging, it can be a struggle. Yes, "As aves que aqui gorjeiam, não gorjeiam como lá..." – a beautiful image, and the bird feels like the perfect symbol for the immigrant.
I hope you'll keep expanding and adding to this story, and that the course has sparked off new stories and moments to write about. Thanks again for sharing your work with us.
PS. For a while I had fantasies about living in Porto :) I went there for a few weeks and loved the city.
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